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Investimentos: Anjo não é santo. Protege, mas não faz milagres

Por Luciano Feltrin

Tradicionais nos Estados Unidos, os investidores anjo começam a ganhar espaço no Brasil. Essa modalidade, composta por executivos, profissionais liberais e gestores que acumularam poupança ao longo da carreira, aplica recursos em startups promissoras. O objetivo é apoiar o crescimento das empresas e obter retorno financeiro médio cinco vezes superior ao capital investido, explica Cassio Spina, fundador da Anjos do Brasil.

Quem são os anjos no Brasil?

O investidor anjo é aquele empreendedor, executivo ou mesmo profissional liberal que foi bem-sucedido em sua carreira e que já conseguiu acumular algum patrimônio. Não é aquele cara multimilionário, mas mais do que o capital que ele vai aportar é a experiência e o valor agregado que ele dá para aquele dinheiro. Os americanos chamam isso de smart money, dinheiro inteligente.

Do que trata esse conceito?

Numa fase inicial, quando a empresa é bem startup, só o capital financeiro não resolve a vida. O smart money incorpora experiência e rede de contatos. É tudo o que o empreendedor precisa nessa fase. É um modelo testado e aprovado nos Estados Unidos.

Existe muita diferença entre a atuação dos anjos aqui e nos Estados Unidos, onde são muito populares?

Não há tantas diferenças assim. Claro que lá eles são mais conhecidos e já têm mais experiência no assunto. O que existe por aqui é que ainda há desconhecimento e mitos sobre o tema. Então, pessoas que têm potencial para atuar como anjos não são. Lá já é um caminho natural e quase automático. Aqui ainda não.

Falta estímulo ou conhecimento para que mais pessoas sejam investidores anjo no Brasil?

Sem dúvidas falta estímulo. Nos Estados Unidos e mesmo na Europa, vários países adotaram políticas nesse sentido. O objetivo foi fazer com que o dinheiro que estava aplicado em investimentos financeiros fosse direcionado para a economia real. Os governos lá já perceberam a importância disso.
Além de estímulo, o investidor também tem receio da chamada desconsideração da personalidade jurídica.

O que é isso?

Isso assusta muito. É o seguinte: o investidor tem medo de que possa aplicar recursos na empresa e que algum eventual passivo recaia sobre ele. Assusta porque é o risco do desconhecido. Não se sabe de quanto pode ser o prejuízo.

É possível mudar esse ponto?

Sim. Há um Projeto de Lei tramitando no Congresso Nacional que tem como objetivo regulamentar isso. É engraçado o Brasil: é preciso criar algo para regulamentar o que já está no Código Civil.
O Código já diz que a desconsideração vale para casos em que haja fraude, dolo, só nesses casos. Mas, infelizmente, há interpretações jurídicas e decisões judiciais bastante diferentes disso.

Qual impacto dessas decisões?

É totalmente contraproducente. Há números que apontam que o Brasil carece de investimentos. O capital existe, mas não entra porque há esse risco.

Que tipos de estímulos os anjos gostariam de ter?

É bom deixar claro que não queremos favor nem benesses do governo. Se eu invisto numa empresa, ela vai contratar bens, serviços, pessoas e gerar tributos. Hoje, o capital anjo não conta com nenhum tipo de estímulo. Acho que os estímulos que o governo criou recentemente para empresas pequenas e médias precisavam ser para todo o mercado e não apenas para empresas com ações negociadas na Bolsa. Até porque uma empresa de menor porte pode demorar vinte anos para chegar à Bolsa. Nos Estados Unidos, chegará em três ou quatro anos.

A Anjos do Brasil tem alguma interlocução com governo e Congresso?

Sim, temos no Senado, na Câmara e no próprio governo federal. Temos procurado mostrar que, se o país quer receber investimentos privados, é preciso melhorar o ambiente e estimular os investidores. O que existe hoje é que alguns brasileiros preferem investir fora do país. O dinheiro não fica parado, gira.

Os anjos gostam de ser chamados de capital de risco?

Essa é uma questão complicada e depende de interpretações. Essa terminologia não é mais adequada. O que fazemos é investir em empresas que geram inovação. Por isso, prefiro usar o termo capital inovador ou capital para inovação, que é o foco do investimento anjo.

Qual a margem de retorno do capital investido por um anjo?

A expectativa é de retorno médio de até cinco vezes o capital investido. Os retornos, porém, podem ser muito maiores, de vinte, trinta vezes ou até mais. São retornos maiores do que qualquer outro investimento.

De onde surgiu o nome anjo para definir esse tipo de investidor?

As pessoas confundem, acham que é bonzinho. Anjo não é santo. Não faz milagre. Anjo vem de anjo da guarda, que é aquele que te dá proteção. O anjo não é aquele que vai fazer por você, não vai resolver seu problema. É preciso ter clareza sobre isso.

Quando e como surgiu a Anjos do Brasil?

Ela surgiu há três anos, quando comecei a trabalhar como investidor anjo e não encontrei nenhum grupo para atuar comigo. Senti a necessidade de criar um modelo aberto e colaborativo de pessoas que tivessem interesse em atuar como investidoras e que pudessem se conectar por conhecimento e experiência. Fui fundador, mas contei com vários colaboradores, como Finep, Endeavor e Abvcap.

A entidade organiza eventos e concursos para reunir startups?

Temos dois eventos grandes. Um deles acontece agora em novembro, uma conferência nacional de investidores. É aberto e tem com proposta gerar conhecimento tanto para investidor quanto para empreendedor.

Por que apenas 5% dos investidores anjo no Brasil são mulheres?

Isso é mundial. Não temos uma explicação objetiva para esse fato. Recentemente foi criado um grupo chamado Mulheres Investidoras Anjo para estimular a participação de mulheres no setor. É uma visão complementar muito importante para nós. É preciso buscar maior equilíbrio nesse sentido.

Que características os anjos buscam nas empresas antes de investir?

Bons projetos e soluções que tragam inovação ou espaço para inovar.

Fora o capital, o que um investidor precisa ter para ser anjo?

É preciso se envolver com o negócio, gostar disso e ter prazer de colaborar com a empresa. É o tipo de investimento que pode demorar muito para dar retorno, embora possa dar um bom retorno. O investimento anjo só vale a pena quando o investidor ajuda de fato o empreendedor a crescer.

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