Uma pesquisa com o título “Governança em empresas estatais – Desafios e estratégias para adequação aos requerimentos da Lei nº 13.303”, promovida pela Empresa de Auditoria Deloitte, em parceria com o Instituto dos Auditores Internos do Brasil (IIA) revela que 81% das empresas estatais de todo o País nos níveis federativo, estadual e municipal, buscaram se adequar à nova legislação que entrou em vigor em 30 de junho último, mas só 40% deram início a mudanças.
A Lei de Responsabilidade das Estatais exige uma série de mecanismos de transparência e governança a serem observados, como práticas de gestão de risco, códigos de conduta, formas de fiscalização pelo Estado e pela sociedade, constituição e funcionamento de conselhos, assim como requisitos mínimos para nomeação de dirigentes.
Os escândalos de corrupção em relação às empresas públicas e sociedades de economia mista apresentados pela Operação Lava-Jato, levaram o governo federal a publicar em 30 de junho de 2016, a lei 13.303 estabelecendo a ela este conjunto de normas que determinou um prazo de dois um para as adequações necessárias às novas disposições legais.
Para saber mais sobre os resultados desse levantamento que avalia a situação das estatais e empresas de economia mista em relação à nova legislação em vigor, o Portal Dedução manteve contato com Marcelo Fridori, diretor do Instituto dos Auditores Internos do Brasil (IIA Brasil) e um dos coordenadores da pesquisa, obtendo dele um depoimento exclusivo.
Marcelo, explique o que esse estudo revela sobre as empresas estatais brasileiras. Estariam elas já adequadas para o cumprimento desta nova lei, agora em vigor?
Muitas empresas promoveram os ajustes em seus processos de governança corporativa, outras, entretanto, ainda apresentam pendências relacionadas, principalmente, com a criação de estruturas, a reformulação de processos e a capacitação dos profissionais envolvidos.
A pesquisa aponta, por exemplo, que 81% das empresas entrevistadas possuem um plano estruturado e formalizado para atender aos requisitos da nova legislação. No entanto, apenas 40% delas realizaram mudanças nos níveis executivos, com o objetivo de adequar a estrutura organizacional aos níveis de qualificação e independência exigidos pela Lei.
Qual a metodologia aplicada na pesquisa e quantas empresas estatais e de economia mista responderam ao questionário?
Aproximadamente 80 empresas, ligadas aos três níveis: federal, estadual e municipal responderam o questionário de forma completa, o que possibilitou uma visão geral e abrangente da evolução no setor.
Quanto à metodologia, participaram da pesquisa empresas estatais e sociedades de economia mista e as respostas foram coletadas por meio de questionário eletrônico entre dezembro de 2017 e abril de 2018.
As respostas vieram dos executivos com poder decisório em qual nível hierárquico?
Os questionários foram preenchidos por presidentes, diretores, superintendente e gerentes das organizações.
Deve-se destacar que os ajustes provenientes da lei envolveram diversas áreas e funções, tais como: conselho de administração, conselho fiscal, comitê de auditoria, diretoria executiva, secretaria de governança, gestão de riscos, conformidade e auditoria interna.
Assim, é possível que algumas empresas tenham contado com a participação de profissionais de diferentes áreas para cobrir os vários aspectos da lei.
Marcelo, a abrangência se deu em todos os níveis; federal, estadual e municipal, mas em quais setores?
Empresas ligadas aos três níveis participaram da pesquisa e entre os principais setores de atividades destacam-se: energia (petróleo e derivados); setor financeiro e securitização; saneamento e habitação; transporte e portuário, e ainda de desenvolvimento regional.
A pesquisa revelou qual seria a maior dificuldade ou o grande desafio encontrado pelas estatais neste processo?
Dentre os vários desafios mencionados pelos respondentes, pode-se destacar a capacitação das pessoas envolvidas.
Por ser uma lei que requer a criação de estruturas novas e a revisão de vários processos, as pessoas envolvidas devem estar muito bem preparadas para desempenhar de forma adequada suas novas atribuições.
Do ponto de vista técnico, algumas questões demandam tempo e dificultam o processo de adaptação. A pesquisa revelou que 53% das empresas apontam o quesito treinamento e capacitação como o principal desafio enfrentado.
Você saberia dizer, através da pesquisa, quais foram as adaptações propostas ou realizadas para o cumprimento da lei 13.303 no tocante à implementação das novas atividades de governança?
Acredito que, além de critérios novos para preenchimento de alguns cargos e da criação de órgãos como o comitê de auditoria e o comitê de elegibilidade, o artigo 9º. trouxe um grande desafio relacionado com a implantação do modelo de três linhas de defesa nas organizações.
De acordo com este modelo, os gerentes diretamente responsáveis pelos processos devem assumir suas responsabilidades pelos riscos e controles dos negócios; para ajudá-los a implantar e monitorar esses riscos e controles, foram estruturadas as funções de gerenciamento de riscos e de conformidade; e, por fim, para testar com independência a eficácia desses controles, tornou-se obrigatória a atuação efetiva da auditoria interna e do comitê de auditoria.
Resta ainda um caminho de aprimoramento a ser percorrido para o cumprimento da lei das estatais em sua totalidade, quais os desafios para essas empresas?
É natural que algumas empresas tenham encontrado menos dificuldades, uma vez que iniciaram antes as adaptações necessárias por conta de outras exigências normativas ou legais.
Mesmo estas empresas, que já evidenciaram o atendimento de todas as exigências, necessitam buscar o aperfeiçoamento contínuo de seus processos, uma vez que o gerenciamento eficaz de riscos e controles pressupõe o monitoramento e a identificação sistemática de oportunidades de melhoria.
Quanto aos aspectos relativos às finanças e contabilidade, sempre os mais focados pelas auditorias, a pesquisa revelou se houve preparativos para que se aumentasse a eficiência e a transparência desses setores em relação à sociedade a partir de agora?
De acordo com a lei, a auditoria interna deve aferir a confiabilidade do processo de preparação das demonstrações financeiras, além de avaliar a adequação do controle interno, que abrange a confiabilidade das informações utilizadas na gestão, mas também as divulgadas ao mercado.
O comitê de auditoria também possui um papel extremamente importante, uma vez que uma de suas atribuições é acompanhar a preparação das demonstrações financeiras e os trabalhos da auditoria independente.
Marcelo Fridori, como representante do Instituto dos Auditores Internos do Brasil que completou recentemente 57 anos de fundação. O IIA Brasil é considerado um dos cinco maiores entre as entidades da carreira dos Auditores em todo mundo. Qual a importância dessa parceria com a Deloitte na formulação dessa pesquisa e quais os resultados que se espera alcançar?
A parceria agrega valor às duas organizações. A Deloitte é uma das maiores empresas de auditoria independente e consultoria e o IIA Brasil está diretamente ligado ao órgão que emite as normas para a prática profissional da auditoria interna no mundo.
Uma pesquisa desse tipo ajuda a entender melhor o que deve receber maior atenção e apoio por parte dos envolvidos. Conseguimos diagnosticar onde devemos concentrar esforços para apoiar as organizações e, dessa forma, melhorar o ambiente geral de controles dessas organizações.
Texto e entrevista: Geraldo Nunes
Foto: Amanajé Comunicação